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19 de maio de 2014

Crítica: Praia do Futuro

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Você nunca pode escapar do seu passado.
Existem filmes que incomodam por temática, abordando assuntos que não conseguimos ver sem desconforto. Outro incomodam por formato com histórias contadas com estilos que fogem dos moldes do cinema. “Praia do Futuro” é uma produção que tem essas duas características, tanto positiva quanto negativamente.
Alternando impacto e velocidade com lentidão, não é um filme que conquistará o grande público, mas que tem seus méritos.
Donato (Wagner Moura) é um salva-vidas na Praia do Futuro, em Fortaleza, e um herói de seu irmão menor, Ayrton (Savio Ygor Ramos, depois Jesuita Barbosa). Um dia, depois de falhar em um salvamento, Donato conhece o motociclista alemão Konrad (Clemens Schick), amigo da vítima, e iniciando um relacionamento com ele, larga tudo para trás e foge para Berlim. Conforme o tempo passa, Donato passa a ter que enfrentar as consequências de sua escolha, descobrindo que não pode fugir do seu próprio passado.
Qualquer tentativa de resumir “Praia do Futuro” cai no que é um dos principais problemas da produção: a história é dividida em três atos, mas como são poucos eventos principais, qualquer sinopse consegue chegar sem esforço ao final. Não é que o filme não tenha história – a grande aposta aqui é na caracterização de personagens. Cada um dos atos tem acontecimentos principais, dando-se a liberdade de deixar várias brechas entre os capítulos.
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Em um primeiro momento, esperamos algo sonoro, violento e catártico: a divulgação e a abertura (bem como os créditos finais) apostam em música alta e letreiros estilosos com cores berrantes. O contraste é imenso com as cores mais naturais e amenas, primeiro das praias de Fortaleza, e depois com o cinza de Berlim.
O diretor opta por tomadas longas, buscando trabalhar mais expressões, gestos e momentos em que falas são pontuais, pouco importando. Estas funcionam como um contraste para os grandes diálogos (especialmente no começo e no final), bem como colaborando para exaltar ações mais marcantes. Isso tem um efeito colateral que não vai agradar muitos: um trio de personagens soturnos, com cenas longas e um desenvolvimento lento – fórmula certa para desinteresse (ou até sono) para os mais incautos.
Isso é especificamente mais grave no segundo capítulo. Enquanto o primeiro é mais intenso, pessoal, apresentando os principais conflitos que vão ditar o fim da história, e o terceiro retorna com diversos elementos temáticos e uma das sequências mais interessantes do filme, a segunda parte acaba sendo a mais morna e cinza.
Ao menos a força no começo e no final funcionam, especificamente quando tratamos do principal do abandono de Donato e das consequências de ter que lidar com seu passado e das coisas que não conseguia enfrentar, encarnadas especialmente na figura de Ayrton.
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Tematicamente, “Praia” gosta de abordar pequenos detalhes que funcionam como símbolos do conflito de Donato e companhia, por algumas vezes óbvios, por outras extremamente discretos. Além do mar e da água alternando simbolismo e realidade, um dos mais proeminentes e interessantes é a maneira que Ayrton, ainda criança, se apelida de “Speed Racer”, chama Donato de “Aquaman” e Konrad de “Motoqueiro Fantasma”. As referências não estão presentes à toa, e mais do que uma simples caracterização, conversam diretamente com elementos da trama.
A “intensidade” prometida pela música e pelos letreiros coloridos até surge no relacionamento dos personagens. As relações do filme se marcam por muito que não dito e por conflitos constantes. Vemos brigas intensas, e até mesmo o envolvimento romântico e o sexo de Donato e Konrad é violento. Ainda em conteúdo, o diretor parece ter uma predileção por mostrar o corpo masculino, e o faz com um cuidado único, mas que por vezes cai no excesso. Um excesso que, diferente de outros, parece menos justificado.
Considerando a montagem, notamos que por diversos momentos parece tentar tratar os três com a mesma importância, mas no fim das contas o personagem de Wagner Moura acaba fazendo as vezes de protagonista. É, inclusive, em sua relação com o irmão que estão os principais elementos, a essência do filme, mais do que em sua fuga ou seu relacionamento com Konrad. De certo modo isso é uma pena, já que o próprio roteiro parece se esquecer disso em alguns momentos, apostando em outros pontos bem menos interessantes.
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Fãs de Wagner Moura provavelmente estranharão a obra, e muitos mais conservadores irão se chocar – afinal, a obra coleciona nus masculinos, incluindo cenas de sexo gay -, mas ela tem seu valor, especialmente em suas explorações temáticas. A lentidão provavelmente vai desagradar à maioria do público, então nem passe perto se isso não for sua praia.
Fonte:POP

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